- Jefferson Linconn
- 24 de fev. de 2020
- 3 min de leitura
Cemitério judeu escondido em Lisboa Autor: Oliver Marshall – Publicado originalmente em The World Elsewhere blog – history and travel writer. See: https://theworldelsewhere.com

21 de fevereiro de 2020. Tradução: Jefferson Linconn
Foi quase por acidente que eu me deparei com o antigo cemitério judeu sefardita do bairro da Estrela, em Lisboa. Quando eu disse a um amigo que estaria visitando o cemitério britânico da cidade, ele me disse que tinha ouvido falar que em algum lugar próximo a aquele Campo Santo também havia um cemitério sefardita.
Enquanto caminhava, na manhã seguinte, pelos terrenos arborizados do Cemitério Britânico, tive a sorte de conhecer Andrew Swinnerton, seu administrador. Ele me explicou que o cemitério judeu ficava ao lado do cemitério britânico e me indicou um caminho que levava a um muro alto que separava os dois cemitérios.
Em 1497, o rei Manoel I de Portugal emitiu um decreto exigindo que os judeus se convertessem ao cristianismo ou deixassem o país. Nos anos e décadas seguintes, dezenas de milhares de judeus fugiram de Portugal, incluindo muitos dos chamados "Cristãos-Novos", ou denominados "conversos", cujas vidas se tornaram intoleráveis, sujeitas a pogroms e à mão de ferro da Santo Inquisição.
Como consequência dessas expulsões, comunidades judaicas sefarditas portuguesas e espanholas terminaram por se estabelecer no Norte da África, Sul da Europa e ainda mais longe. A maioria desses exilados encontrou novos lares sob a proteção dos sultões e califas do Império Otomano e do Marrocos. Outros fugiram para o Norte, para Amsterdã, Londres, Hamburgo e outros centros comerciais, ou através do Atlântico para Curaçao, Nova Amsterdã, hoje Manhattan, Suriname, Pernambuco e outros lugares do "Novo Mundo".
Cerca de trezentos anos depois de deixar Portugal, os comerciantes judeus começaram a voltar para sua terra natal ancestral. Embora ainda houvessem firmes restrições sobre os judeus no país, no entanto, como estrangeiros, os recém-chegados puderam contar com pelo menos alguma proteção. Graças à relação especial que existia entre a Grã-Bretanha e Portugal, os sefarditas de Londres e especialmente Gibraltar, que era um território britânico desde 1713, tornaram-se uma presença significativa em Lisboa.
Mas no século XIX, a comunidade judaica de Lisboa esteve, de fato, em uma posição delicada, uma vez que o catolicismo havia se tornado a única religião permitida aos cidadãos portugueses. E, como tal, os judeus não tinham existência legal e, desse modo, a comunidade era considerada apenas como uma colônia estrangeira.
Logo após o retorno dos judeus a Lisboa, ficou claro que seria necessário um cemitério. Como muitos membros dessa nova comunidade eram britânicos, um canto do cemitério protestante britânico (ou o "cemitério inglês", como era chamado quando foi criado em 1721, foi seccionado para seu uso.
O primeiro túmulo do cemitério judeu de Estrela foi o de José Amzalaga, que morreu em 26 de fevereiro de 1804. Por sessenta anos, esse foi o único cemitério judeu de Lisboa, o local de descanso final dos britânicos, marroquinos e outros sefarditas, e cada vez mais seus co-nascidos portugueses. religiosos. O último enterro ocorreu em 1865, período em que não havia mais espaço. Logo em seguida, no entanto, um novo cemitério judeu foi estabelecido, ainda no ano de 1868, o qual permanece em uso até hoje.
O acesso ao cemitério judeu é restrito, suas grandes portas de metal quase sempre estão trancadas e, desde a rua, não é impossível se ver por cima dos seus muros altos. Porém, ao me aproximar do cemitério britânico, consegui abrir uma frágil porta de papelão que levava ao terreno de um prédio vizinho vazio, o antigo hospital britânico. Isso, junto com o presbitério anglicano, o Royal British Club e o Estrela Hall, a casa de longa data da Lisbon Players, uma companhia de teatro em língua inglesa, a qual já fez parte do chamado "Bairro Britânico" de Lisboa.
Após mais de trezentos anos de propriedade da British Crown, o governo britânico vendeu esses edifícios em 2018 para uma incorporadora imobiliária. Enquanto o Cemitério Britânico e a Igreja Anglicana de São Jorge não foram incluídos na venda, o Cemitério Judaico o fora - embora felizmente essa parte da propriedade permaneça protegida, sob os cuidados da Comunidade Israelita de Lisboa.
Do pequeno pátio traseiro do antigo hospital, consegui subir alguns degraus para uma escada de incêndio, em seguida, consegui me inclinar sobre um muro alto e espiar os terrenos compactos deste cemitério normalmente escondido. As cento e cinquenta lápides, com inscrições aparentemente em hebraico, estão colocadas horizontalmente, da maneira tradicional sefardita. Em breve, apenas os ocupantes dos condomínios de luxo planejados terão essa visão privilegiada. Espero que eles apreciem isso.